Em entrevista à rádio CBN, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, deu uma declaração franca sobre o estádio do Engenhão, interditado por motivo de risco à população: “Foi feito nas coxas”. Quer dizer, foi feito de qualquer jeito, sem capricho.
A expressão “fazer nas coxas”, diz-se, teria surgido na época da escravidão no Brasil. Os escravos doentes ou incapazes de trabalhos pesados eram designados para a tarefa de moldar em suas coxas o barro quente, que viraria telha. Porém, como cada escravo tinha a coxa de tamanho e formato diferente, as telhas saíam desiguais. Quando o telhado era montado, ficava torto, com a aparência de que tinha sido malfeito. Tinha sido feito nas coxas.
“Fazer nas coxas” é algo tipicamente humano. Queremos fazer várias coisas ao mesmo tempo, e não fazemos nenhuma direito. Confundimos agilidade com pressa, e derrapamos na precipitação. Queremos tudo, e temos pouco. Vivemos os dias pensando no amanhã, que talvez não venha, e descartamos o presente.
São decisões tomadas nas coxas, por parlamentares que faltam às sessões e decidem sobre projetos nacionais sem um mínimo de conhecimento da realidade. São discursos feitos nas coxas, altamente demagógicos, tão duráveis quanto um período de eleição e tão esquecidos quanto a memória do povo.
E ainda por cima nos espantamos com as manchetes dos jornais. Ficamos surpresos que existam líderes de igrejas acusados de pedofilia, de abuso sexual e lavagem de dinheiro. Multidões sendo enganadas por alguns autointitulados “ministros do evangelho”, com uma teologia feita nas coxas, sem substância, sem fundamento, sem profundidade, mas camuflada com discursos inflamados e retórica ilusionista.
Está na hora de dar um basta. Chega de fazer as coisas nas coxas.
Isso parece tão complexo, mas podemos começar com pequenas atitudes no dia-a-dia, como as que vi e ouvi dias atrás: um homem ajuntou cédulas de dinheiro caídas do bolso de uma jovem e devolveu para ela; outro devolveu à atendente do cartório o troco recebido a mais; um cidadão fez uma “vaquinha” entre amigos para ajudar uma pessoa carente; um motorista resolveu ser cortês com uma mãe que atravessava a rua com seu filhinho; outro se propôs a orar com alguém que descobriu uma enfermidade e terá de passar por tratamento cirúrgico; um menino resolveu repartir seu lanche e seu brinquedo com o colega, orientado por sua mãe; outra criança, à mesa, dirigiu uma oração de agradecimento a Deus pela saborosa refeição; uma professora alertava os pais sobre o comportamento do filho na escola; e um idoso senhor ainda orientou jovens a andarem com suas bicicletas pelas ruas, e não pelas calçadas.
São pequenas ações que, se não forem feitas nas coxas, evitarão que nossas vidas sejam um telhado com telhas desproporcionais, que não encaixam, deixam buracos e proporcionam goteiras em nossa cuca.
Nestas horas é bom lembrar ainda que Deus não fez nada nas coxas. Pelo contrário: Ele deu o seu melhor, em Seu Filho Jesus. E o que Ele prometeu aos que confiam no esplêndido e competente serviço feito por Jesus também não é nada feito nas coxas.
Esse amor vertical, quando vivido na horizontal, é tão caprichoso que não deixa espaço para fazer nada nas coxas.
P. Julio Jandat
Igreja Evangélica Reformada de Itararé